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O INSTITUTO GREGORIO BAREMBLITT nasce do encontro de um grupo de amigos com um desejo comum de reinventar novas práticas sociais. Para tanto constituímos uma associação sem fins lucrativos. Seu nome é uma homenagem ao psiquiatra, psicoterapeuta, professor, pesquisador, analista e interventor institucional, esquizoanalista, esquizodramatista e escritor Gregorio Franklin Baremblitt. Nosso desejo é que este dispositivo tenha uma inserção social e que possamos construir com nossa comunidade um Outro Mundo Possível.

quarta-feira, 16 de março de 2011

NOSSAS COMPANHIAS: OS CAPS E OS DILEMAS DA REFORMA PSIQUIÁTRICA

OS DILEMAS DA REFORMA PSIQUIÁTRICA: PRAXIS MILITANTE VERSUS BUROCRATIZAÇÃO
Jorge Bichuetti,  20/11/09, Congreso Internacional de Salud Mental y Derechos Humanos, Buenos Aires, Argentina.
Pensar o que fazemos no serviço e cuidar numa outra lógica é atentar para a produção do hospício no serviço aberto.
Galeano e sua pergunta – Por que Che está sempre nascendo? Por que dizia o que pensava e fazia o que dizia. Palavras e fatos raramente se encontram, e, se encontram,raramente, talvez   se reconheçem. Hoje, muitas vezes nos serviços substitutivos, necessitamos estranhar as práticas e não nos reconhecermos .
O Brasil tem um novo paradigma, dar conta do fim do hospício, da diminuição dos leitos, da exclusão da loucura, do preconceito. É a clínica do Direito à Diferença, e ela   trazendo-nos novos  o sentidos.
A burocracia é um fator de exclusão, por que dificulta o acesso. A padronização, como por exemplo, do número de usuários do serviço, as normas políticas, fragilizam os projetos. Em contrapartida a isso vem a invenção da construção humana de vínculos, o direito ao acesso, o avanço de trabalhos. E ainda assim é preciso lidar e conviver com a burocracia.
A clínica na reforma psiquiátrica, não é médica, pois esta exclui, sempre há algo a ser corrigido na loucura; é necessário uma clínica de trocas.
O manicômio é mais que um lugar de portas fechadas. É a especialização, a seguimentação, as divisões que limita a comunicação e influenciam no viver da clínica. Para Rotelli, é o lugar de troca zero. Estamos inventando um entre para o diálogo?. O saber de alguém anula o desejo do outro? Porque podemos estarfragilizando as  trocas e reinstituindo o manicômio.
No antimanicomial, a circulação é importante. É proibido entrar na cozinha, mas em casa entramos, temos acesso livre. Os espaços de convivência  quebram a lógica de algo/alguém  que cuida do defeito do outro. Precisa ser rizomatizado, é onde todos são pessoas. É a psicoterapia libertária, oficinas como espaço para arte, cultura, lazer, autonomia, onde se  possa cuidar da dor vivida pelo sofrimento mental na plenitude do exercício transversal da cidadania.
O paradigma da clínica de especialidade, fala da neutralidade. Vínculo é diferente de neutralidade, é ternura, faz sentir que o outro o contém, não no sentido da continência física, mas no da pertinência. Rompe com o cinza e o morto da vida hospitalar. A seriedade e a postura comedida  afasta o outro.
A ética e estética, não é cinza, é “Mangueira” e “Olodum”. A alegria abre perspectivas. Cria coletivo, sem o coletivo na clínica, é impossível pensar.Nele,  todos se sentem pertinentes ao dispositivo de cuidado.
Há o polarizar paranóico onde o outro é meu temor ou  cuidador. O guerreiro, combate o medo e traça condições de vida, não há como desconectar de emergências sociais, dos movimentos, sempre ligados à questão de morte/vida. É preciso haver o lugar da loucura na sociedade, e da sociedade na loucura. Urge discutir a perspectiva  da inclusão, humanização, solidariedade, cidadania. É preciso a coragem do guerreiro: a especialidade fez com que fossemos nos inibindo.
O CAPS não funciona numa perspectiva manicomial. Se assim o for, pode ser um ambulatório ou algo similar, não um CAPS. É algo que tira o homem de uma perspectiva histórica de ofício, repetitiva e alienante. É uma militância contínua. Algo próximo ao que diz Guatarri  “militar é agir”.  E Pichón “não existe cura fora da militância”. Militar é algo que carrega amor, generosidade, um movimento parecido com o de São Francisco de Assis, que foi uma militância no modo de viver e agir, onde suas limitações( se auto-mutilava e ouvia vozes)  não o impediram de viver sua subjetividade com potência de vida;  e não uma militância de decisão programática e  discursiva(autoritária).
O campo de luta das Madres, é a prática solidária real, não se perde a utopia, são sonhos compartilhados (sueños compartidos), sonhos que geram escolas, creches, trabalhos sociais. Militar é sobreviver, é o passivo e ativo que está na peça de construção de morte. È preciso viver a morte para saber disso. Pavlovsky diz que a construção de micropolíticas, pequenos grupos e os enfrentamentos necessários, produzem campos de vida.
A contribuição da especialidade cristaliza o trabalho, diminui o fluxo de democracia e trocas no trabalho e no CAPS.  Ele reproduz algo que o define. A Reforma Psiquiátrica não se faz com especialistas, mas contra os especialistas. Se eu sou reformista e o outro é anti-reformista, a transversalidade da equipe diminui, renasce o hospício, uma zona de troca zero. Se se nega a potência da transversalidade, se reproduz o manicômio.
Repensar:  o movimento de luta, o espaço no aparelho de Estado, construção ousada das experiências que  geraram o movimento psiquiátrico de vanguarda, o cuidado de usuários, o trabalhador de saúde mental; é fazer da auto-gestão e  da gestão de trocas, um espaço livre, liso.
A política do Ministério da Saúde tende a enfatizar especialistas: a clínica não é coletiva, protocolos são individuais, atos separados de ações, e  de outros especialistas.
A coletividade deve ser a   referência, o coletivo é difícil de ser montado, mas é um fim em si mesmo, gera troca, é continente. O lugar do crescimento não é o lugar da especificidade, enquanto ato, seja médico, psicológico, psiquiátrico ou de terapia ocupacional.
Pensar em reforma, não é pensar como conceito, é, a partir e além de si, pensar na dor do outro. É atentar para o crescimento do poder hospitalizante hoje, para a indicação cada vez mais freqüente de ETC e reafirmar nossos princípios..
Ser funcionário e ocupar funções, é estar bem com uma ética profissional, normatizada. Mas decidir qual o caminho e a direção terapêutica singularizante,    é uma ética pessoal e   coletiva. A portaria é apenas um mediador, que deve ser subsumida pela   ética do direito à diferença.
O que nos cabe é perceber diante do sonho de uma clínica transversal de devires, a construção do novo mundo com direito à diferença.
Quero ser um burocrata? Ou ser um revolucionário? Se não somos na reforma militantes  partidários, somos militantes micropolíticos... Qual chamamento para a vida tem sentido? São alguns perigos que temos na saúde mental, somos pouco nascedores, temos pouco espírito de Che, de ser um eterno nascedor.
É preciso questionar o lugar de poder da especialidade, se vou fazer uma cirurgia plástica, quero um bom cirurgião, mas se sou louco, quero uma equipe transversal, solidária com espírito guerreiro e ternura; que conheça a especialidade, mas que não tome posse dela evitar, bloquear e inibir a vida, potencializar oos vínculos e os espaços de singularização.
 Não tem como trabalhar sem maternagem no CAPS, não há CAPS sem festa: o CAPs não pode se converter num aparato cinzento de intervenções anêmicas e de silêncio normatizador.
Ousemos... Inventemos... E que  repitamos com os surrealistas: não será o medo da loucura que nos fará baisxar as bandeiras da imaginação.
Pelo direito à loucura, pela defesa da inclusão social e dos direitos humanos, por fazer caber na sociedade a loucura, tomemos de assalto... a rua, a cidade e o céu.
 
 

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